Um testemunho de fé

Antes de qualquer coisa, este texto busca compartilhar o que eu costumo chamar de uma “experiência de fé”.

     Minha família é cristã, busco ser um bom cristão e, obviamente tenho os meus pecados. Frequentamos a missa, normalmente aos domingos, e eu sempre observava, em determinada parte da celebração, a minha mãe dizer “Senhor eu creio em vós, mas aumentai a minha fé”. Confesso que, apesar de me sentir tranquilo com a maioria das preces e orações que fazemos durante a missa, nessa parte eu sempre sentia algo diferente, uma espécie de receio de que Deus levasse a sério (e porque ele não levaria?) e resolvesse aumentar a minha fé de alguma maneira “pouco confortável”. E se eu passasse por algum tipo de provação muito difícil, ou algo do tipo? Estaria eu mesmo pedindo para sofrer, ou algo assim? Bom, de qualquer forma, um dia eu resolvi encher o peito e falar bem firme: “Senhor eu creio em vós, mas aumentai a minha fé!”.  Depois veio aquela sensação: “eita, agora já foi”, mas tudo bem.

     Pouco tempo depois, minha esposa engravidou. Ela já havia sofrido um aborto espontâneo no passado, então havia uma preocupação a mais, mas os exames mostravam que dessa vez era pra valer: nós seríamos país! Como um casal relativamente jovem que somos e, na época, futuros pais de primeira viagem, havia aquele nervosismo normal, mas nos exames de ultrassom aumentava um pouco por causa do que tinha acontecido no passado. No segundo exame de ultrassom, a médica viu alguma coisa estranha (na verdade deu até para eu ver também, mas, como aquelas imagens de ultrassom são confusas, preferi esperar o que a médica diria) e nos avisou, mas disse que repetiria o exame duas semanas depois para ter certeza.  Não dava pra saber o que era, mas você pode imaginar a nossa aflição numa hora dessas.  A imagem mostrava algum tipo de falha bem na região cervical da coluna. Geralmente, no período em que a gestação se encontrava (bem no começo), é complicado dar esse tipo de diagnóstico, e até o obstetra que acompanhava o pré-natal achou estranho, mas a doutora que fez a ultrassom tinha visto algo sim, os exames posteriores só serviam para confirmar que a falha existia. O diagnóstico exato, não estava absolutamente fechado, por alguns fatores: primeiro, a imagem de ultrassom não é tão boa como a de outros exames (como uma ressonância, por exemplo); segundo, a posição da lesão deixava dúvidas sobre o tipo exato. Poderia ser uma meningocele, ou uma mielomeningocele, ou pior ainda, uma encefalocele. Não somos médicos, mas a essa altura já estávamos pesquisando muito na internet e depois acabamos conversando com vários médicos. Só para resumir (repetindo, não somos médicos) ambos os tipos de lesão são chamados de “defeito aberto do tubo neural”: um falha nas vértebras e/ou no crânio, que provoca uma herniação  do conteúdo. Este conteúdo pode ser somente líquor ou líquor e nervos (no caso de meningocele ou de mielomeningocele), ou ainda conteúdo cerebral (no caso de encefalocele). Esses problemas têm lá os seus riscos de sequela, sem falar no risco de outros problemas congênitos. Geralmente um neurocirurgião faz a cirurgia para remover o conteúdo herniado e fechar o local.

     Passada a fase do susto, estava na hora de pensar em como passar por isso. Eu me lembrei da minha vida toda até então. Sempre superei as dificuldades (embora bem mais leves do que essa) me esforçando e pedindo o auxílio de Deus. Eu sempre tinha fé que ele me colocaria no caminho correto, nos estudos, no trabalho, etc. Mesmo quando algo parecia não estar bem, mas se tinha que ser enfrentado deveria ser para algo melhor lá na frente. E isso sempre deu certo! Você pode estar pensando: “Mas ajuda Dele? Não teria sido Ele que te colocou nessa situação? ” Veja bem, é uma pergunta que a pessoa pode mesmo se fazer. E eu até entendo, sinceramente. Mas eu decidi fazer a mesma coisa que sempre fiz e ter um pouco mais de fé. Pensei: “Se for pra ser assim, que seja; se for uma provação, que seja; se não for, que não seja; seguindo o meu histórico de diálogo com Deus, vamos enfrentar com fé e confiança”. Agora você pode estar pensando: “Ah..tá, quer dizer que você ficou super tranquilo a partir daí ?” Claro que não! Sou um simples humano, continuei tenso e preocupado, mas decidido em fazer o que tinha que ser feito, com fé. E você pode ainda se perguntar: “Diálogo como Deus?”. Sim, mas não falo de ”ouvir uma voz me dizendo o que fazer ou algo do tipo” , mas sim das experiências que tive e do que extraí delas. 

     Eu disse que conversamos com vários médicos. Pois bem, começamos conversando com a médica da ultrassonografia e com o obstetra da minha esposa, depois com uma médica da região recomendada por um amigo meu e por uma tia, pois ela fazia parte de um grupo de médicos que atendia a esses casos no hospital universitário (mesmo sendo público e eu tendo plano de saúde, na época era o hospital com a melhor estrutura para casos complexos). Depois dessa médica, minha esposa ficou fazendo o pré-natal com outra médica no hospital universitário. Mas durante todo esse tempo também pesquisávamos sobre os especialistas de fora. Encontramos uma neurocirurgiã pediatra em São Paulo que é uma das referências no país, viajamos pra lá e consultamos com ela (sim, saiu bem caro, mas queríamos fazer o melhor possível). Na ocasião ela comentou de um amigo dela, também neurocirurgião que tinha vindo de lá para a nossa região há muito tempo e que ela tinha ficado em São Paulo e assumido os trabalhos por lá. Ela disse que o melhor era que minha esposa fizesse uma ressonância magnética fetal, para vermos com precisão a posição, o tamanho e o conteúdo da herniação. Mas devido o período da gestação não foi possível fazer o exame naquela ocasião. Então fizemos ao menos uma nova ultrassonografia, o médico do exame nos deu bastante informação, nos dizendo mais ou menos a extensão da lesão, mas não conseguiu extrair mais informação porque durante todo o exame nossa filha ficou com a mãozinha sobre o local da lesão, escondendo do médico.

     Voltamos de São Paulo. Se fizéssemos tudo em São Paulo, o plano de saúde não cobriria e já estávamos nos preparando para entrar na justiça para conseguir que o plano cobrisse ao menos uma parte dos gastos. Além disso, minha esposa tinha um prazo limite para poder viajar, por causa da gravidez. O advogado que nos orientava, comentou sobre um neurocirurgião muito amigo dele e acabamos descobrindo ser um dos médicos com os quais já estávamos consultando na nossa região. Este, por sua vez, confirmou uma coisa que a médica de São Paulo já tinha dito: que precisávamos de uma ressonância magnética fetal, mas na nossa cidade não havia ninguém que fizesse esse exame. Ele também comentou sobre o chefe dele no hospital, outro neurocirurgião muito experiente. Só por garantia, fomos consultar com ele também. E adivinha só? Era o amigo da médica de São Paulo, aquele que há muito tempo tinha vindo de lá. Ele ligou para o telefone dela na nossa frente e os dois conversaram sobre o caso. Os acontecimentos até o momento estavam nos deixando um pouco mais tranquilos, por que, ao que tudo indicava, estávamos no caminho certo e nas mãos certas (falo de todos os médicos por quais nós passamos).

      O tempo ia passando e algumas decisões precisavam ser tomadas: viajar ou não, operar no hospital universitário ou no particular (dependendo da estrutura que seria necessária), dentre outras. Mas tudo isso dependia da ressonância fetal. Estávamos programando outra viagem quando apareceu um médico que realizava esse exame na nossa cidade e minha esposa, pelo que ele disse, foi a primeira a fazer esse exame no nosso estado. Fizemos o exame e todos aguardavam o resultado (nós e os médicos). O resultado saiu, mostramos aos dois neurocirurgiões locais e enviamos à de São Paulo. Eles disseram que havia condições de fazer a cirurgia na nossa cidade sim, a lesão apresentava somente líquor herniado, então, de todas as possibilidades, parecia ser a menos grave e o parto poderia, inclusive, ser na maternidade onde havíamos planejado no início da gravidez.

     Com tudo isso que ia acontecendo, embora nervoso e tentando controlar a ansiedade, eu não me sentia sozinho, nem abandonado, nem nada do tipo. Pelo contrário, eu sentia que Deus estava conosco e seguiríamos em frente, sempre com fé. Enfim chegou o dia do parto, minha filha nasceu e dois dias depois passou pela neurocirurgia. Ainda ficou alguns dias na UTI, pois esse tipo de procedimento exige observação. Pouco depois foi para o quarto e depois para casa. Enquanto escrevo esse texto ela está completando um ano de vida, linda, alegre e com saúde. Graças a Deus e a todos que de uma forma ou de outra contribuíram para que tudo desse certo.

     O que eu quero dizer com tudo isso é que, independente da situação, vale a pena ter fé. Isso nos dá ânimo, perseverança e bênçãos.